terça-feira, 17 de setembro de 2013

CARTA À SBPC SOBRE O PROGRAMA ESPACIAL BRASILEIRO



Motivada pela reportagem da Revista Carta Capital
http://www.cartacapital.com.br/politica/o-destino-de-alcantara-8527.html,

a Comissão Espacial da SAB após várias discussões se posicionou sobre a questão do Programa Espacial Brasileiro (PEB) e o Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) e decidiu enviar uma carta à presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Dra. Helena Nader que transcrevo a seguir. A carta foi enviada ontem, dia 16 de setembro de 2013. Cópias desta carta foram também enviadas para a SBGf, SBF, AAB e Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (AIAB).

Por coincidência o edital do Jornal O Estado de São Paulo trata justamente desta questão.



São Paulo, 16 de setembro de 2013
Exma. Sra
Dra. Helena Nader
Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
São Paulo - SP

At.: Programa Espacial Brasileiro
c/c: Agência Espacial Brasileira AEB/MCTI

Prezada Presidente da SBPC Dra. Helena Nader,

O desenvolvimento das atividades espaciais no Brasil desde 1961 tem se deparado com inúmeros desafios que comprometeram e ainda impedem que o Programa Espacial Brasileiro (PEB) seja bem sucedido.

Em governos passados, foi notório o aporte descontínuo e insuficiente de recursos combinado com a falta de mão de obra e de uma política de incentivo e promoção da participação das indústrias no PEB. Devemos destacar o contínuo cerceamento tecnológico ao Brasil produzido diretamente pela restrição ao acesso a componentes e equipamentos considerados sensíveis por governos estrangeiros e por tratados internacionais como o MTCR- Missile Technology Control Regime. O Brasil atualmente é signatário do MTCR, porém continua sofrendo restrições à importação de vários itens essenciais para as atividades espaciais, pois os países em questão levaram anos e empenharam muitos recursos para dominar essas tecnologias e, naturalmente, podem sentir dificuldades em aceitar acordos de transferência tecnológica.  Apesar do desenvolvimento conjunto de satélites científicos ser um bom instrumento para facilitar o diálogo com as nações estrangeiras, há sempre o risco de que a escolha dos parceiros limite o leque de oportunidades em função dos interesses geopolíticos dessas nações.

Em outubro próximo, a Presidenta Dilma deverá ir aos EUA para tratar das relações entre Brasil e EUA com a perspectiva de celebração de acordos envolvendo o PEB, em particular, o uso do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA).  A Sociedade Astronômica Brasileira (SAB), como entidade civil diretamente interessada na promoção e desenvolvimento da ciência e da tecnologia espacial no Brasil, vem por meio deste documento alertar a SBPC e os vários órgãos e entidades envolvidas com o PEB a respeito de alguns aspectos que ela considera importantes.  Para que qualquer acordo proposto, ou que venha a ser celebrado, entre Brasil e EUA seja benéfico para ambos os países, devemos levar os seguintes pontos em consideração:

1-    O governo dos EUA, através de seu Departamento de Estado, constantemente se manifesta e atua no sentido de dificultar a possibilidade do Brasil possuir um programa próprio de foguetes lançadores de artefatos espaciais. Desde a interrupção do programa de foguetes de sondagem Nike - Apache no início dos anos 60, no Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI), passando pelas dificuldades do Veículo Lançador de Satélites (VLS) durante a Missão Espacial Completa Brasileira (MECB) nos anos 80 e 90, até a proposição do acordo de salvaguardas em 2001, que foi rejeitado pelo Congresso Nacional por não respeitar a soberania do país, ficou claro que os EUA não apoiam os programas brasileiros voltados para o desenvolvimento de veículos lançadores de satélites.
2-    O bloqueio tecnológico imposto pelos EUA não se estende só à tecnologia de lançadores espaciais, mas também se aplica a satélites, como ficou demonstrado recentemente nas dificuldades que afetaram o programa CBERS (“China-Brazil Earth Resource Satellites”); os EUA procuraram impedir a compra pelo INPE de dispositivos e componentes para as câmeras multi-espectrais de observação da Terra para os próximos satélites da série.
3-    O uso comercial da base de lançamento em Alcântara (CLA) é de fato importante para a sustentação econômica do PEB. No entanto, o estabelecimento de qualquer acordo que atente contra a soberania nacional é inaceitável. 
4-    Os recursos oriundos das atividades comerciais de lançamento devem ser  aplicados no PEB. 
5-    A montagem e integração de cargas úteis e satélites aos foguetes devem ser sempre acompanhadas pelas autoridades nacionais responsáveis. No entanto, acordos comerciais podem vir a ter cláusulas que exijam que as equipes (brasileiras) de acompanhamento mantenham sigilo total sobre características e ou tecnologia dos satélites, cargas úteis ou veículos espaciais que estejam sendo lançados a partir do CLA.

A SAB propõe ainda que a AEB promova um debate com os vários atores envolvidos com o PEB, tais como SBGf, SBF, AAB e Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (AIAB), antes da visita da Presidenta Dilma aos EUA. A SAB entende que este debate é importante para subsidiar o governo brasileiro no caso de negociações entre os dois países que envolvam a área espacial.

Agradecemos a atenção dispensada e despedimo-nos atenciosamente,

Comissão Espacial da SAB
João Braga (INPE) – Presidente da comissão
Antônio Fernando Bertachini Almeida Prado (INPE)
Eduardo do Couto e Silva (UnB)
Eduardo Janot Pacheco (USP)
José Leonardo Ferreira (UnB)

Adriana Válio
Presidente
Sociedade Astronômica Brasileira

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